terça-feira, 17 de março de 2009

...DANO MORAL

Nem tudo está perdido...
Recente decisão proferida pelo Juizado Especial Cível de Arujá, em processo onde atuo pela Autora, bem explicitou o que sempre lemos em obras doutrinárias: que indenização por danos morais deve ter tanto a função pedagógica quanto a reparatória. Ou seja, deve fazer com que o ofensor não mais pratique condutas semelhantes (deve "ensinar" o ofensor), e com que a dor moral sentida pela vítima seja, de alguam forma, reparada. Trata o processo em questão de ação de indenização por danos morais movida pela Vítima L.S.P, contra um veículo de comunicação da cidade, por conta deste ter noticiado que a vítima teria praticado um aborto criminoso quando, na verdade, ela sofreu um aborto espontâneo, originário de problemas em seu aparelho reprodutor. O Conteúdo da decisão é por demais nteressante, não só pelos argumentos apresentados pelo Magistrado, quanto por tratar de um tema muito recorrente em nosso dia-a-dia profissional. Segue abaixo a decisão, na íntegra:

VISTOS. Requerente: LUCINÉIA DA SILVA PEREIRA Requeridos (XXXXXX)Relatório dispensado (art. 38, caput, da Lei 9.099/95). Ação de indenização por danos morais, em razão de dano à imagem da autora, decorrente de publicação de notícia no jornal requerido. Não prospera a alegação de decadência formulada na contestação. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que acolheu a reparação por danos morais, sofridos em razão de qualquer fato, em caráter irrestrito, alçada ao nível de garantida individual, sem previsão de qualquer prazo, evidentemente perdeu vigência o curto prazo estabelecido na Lei de Imprensa para a postulação de indenização. Nesse sentido: Indenização. Lei de imprensa. Dano moral. Decadência. Art. 56 da Lei Federal 5.250/67.Inaplicabilidade. Pretensão amparada pelo art. 5º, V e X, da CF – “Agasalhada a indenização pelo dano moral de forma tão ampla e irrestrita pela Constituição Federal de 1988, inaplicável o prazo decadencial do art. 56, caput, da Lei de Imprensa” (TJSP – 9ª C. Dir. Privado – AI 26.539-4 – Rel. Franciulli Netto – j. 04.02.97). Destarte, ante a ausência de previsão do legislador constitucional de prazo decadencial específico, é aplicável a norma fundamental estabelecida no art. 205 do Código Civil. No mérito, a ação é parcialmente procedente, considerando-se a verificação de dano moral e a necessidade de se reduzir o montante postulado a título de reparação, que se mostra excessivo. A manifestação do pensamento e a liberdade de imprensa, embora garantidas na Constituição Federal, sofrem limitações em determinadas circunstâncias. A Carta Magna, em seu art. 5º, V e X, protege a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, enquanto atributos da personalidade. Assim, a prevalência de um ou outro princípio deverá ser aferida em cada caso concreto. Como regra, a liberdade de imprensa e de manifestação do pensamento somente não será lícita nos casos em que se verifica abuso do direito de informar e divulgar. De acordo com a lição de Rui Stoco, “Este abuso pode ser identificado quando se noticia fato (ou imagem) não verdadeiro; quando o fato, apesar de verdadeiro, é desvirtuado, deturpado, “dramatizado”, caricaturizado ou satirizado, de modo a tornar-se ofensivo e danoso; na hipóteses de calúnia, injúria e difamação; quando o fato, embora verdadeiro e divulgado corretamente e com exação, encontra vedação legal (como, por exemplo, no caso dos menores de dezoito anos ou na difusão de opinião favorável ou contrária a candidato, partido político ou coligação e a seus órgãos ou representantes, a partir do dia 1º de julho do ano de eleição, por força da Lei das Eleições); ou, ainda que verdadeiro e divulgado correta e adequadamente, tem o poder de causar gravame, submeter ao ridículo, denegrir a imagem da pessoa, tornar sua vida insuportável ou arruinar sua vida privada ou profissional” (“Tratado de Responsabilidade Civil” – 7ª ed., p. 1774 – Ed. RT). O caso versado nos autos enquadra-se na última das espécies de abuso acima descritas, qual seja, a de fato que, ainda que verdadeiro e divulgado correta e adequadamente, tem o poder de causar gravame, submeter ao ridículo, denegrir a imagem da pessoa. Com efeito, a notícia veiculada pelo requerido em relação à autora denigre a imagem desta, por atribuir-lhe grave conduta punida no âmbito penal. Ressalte-se ainda que não há qualquer comprovação acerca da alegada veracidade do fato atribuído à autora na notícia, considerando-se que um simples boletim de ocorrência não produz o efeito de comprovar, de forma definitiva e inconteste, a ocorrência do fato. A propósito, não consta dos autos qualquer elemento que indique que a autora tenha sido processada, ou mesmo indiciada pelos fatos narrados na notícia veiculada pelo requerido. Assim, caracterizado o abuso no exercício da liberdade de informação, surge a obrigação de indenizar, tendo em vista que a ação do requerido causou prejuízos morais à requerente. De fato, ainda que da notícia conste apenas as iniciais da autora, não se pode olvidar que o texto permite a sua identificação, uma vez que, além das iniciais, forneceu outros dados, como idade, estado civil e bairro em que reside. Nesse sentido, a prova oral produzida em audiência confirma que foi possível identificar a requerente como a pessoa referida na publicação. Logo, ante o teor da matéria jornalística, evidente o prejuízo à imagem, bem como a honra objetiva e subjetiva da autora, que deve ser reparado, mas não no montante pleiteado na inicial. Oportuno registrar que, se a divulgação somente das iniciais não foi apta a evitar a identificação da autora, em face dos outros dados fornecidos, por certo reduziu a intensidade do dano, que foi menor do que teria sido caso o nome por extenso fosse divulgado, circunstância que influi na fixação do valor da reparação. A indenização por dano moral tem natureza compensatória, cujo objetivo é proporcionar ao lesado meios para atenuar os efeitos do prejuízo extrapatrimonial, sem acarretar enriquecimento sem causa. Assim, observando os princípios da razoabilidade e da equidade, bem como a culpabilidade dos requeridos, as condições econômicas do lesado e a natureza e extensão do prejuízo, fixo o valor da indenização em importância correspondente a 15 (quinze) salários mínimos. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação para condenar os requeridos a pagarem à autora a importância correspondente a 15 (quinze) salários mínimos, vigentes à época do efetivo pagamento, a título de indenização por danos morais. Nesta fase não há condenação em custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/95. P.R.I.C. Arujá, 06 de fevereiro de 2009. FERNANDO CESAR CARRARI Juiz de Direito

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