O Direito Penal está como deveria estar ?
Nos cursos jurídicos, muito se fala e pouco se questiona. Infelizmente, ainda não conseguimos nos distanciar do papel de meros captadores de informação em sala de aula, o que, principalmente nos cursos de Direito, é imprescindível. Aprendemos sobre os diversos institutos de Direito Penal (no nosso caso em particular), mas não somos estimulados a refletir sobre a real importância e coerência destes institutos.
Sendo que: uma séria reflexão sobre alguns institutos penais é indispensável para responder à indagação constante no título das presentes considerações. Teceremos alguns breves comentários sobre alguns poucos institutos, visando assim incentivar, ao menos com relação à estes, uma análise racional.
O Direito Penal nos dias de hoje, segundo respeitáveis doutrinadores, persegue duas metas básicas, quais sejam: o garantismo e a intervenção mínima. Em outros termos: chegou-se a conclusão que o controle social penal deve ser cercado de garantias para que a liberdade do cidadão não seja indevidamente restringida e que o Direito Penal, em face das nocivas conseqüências inerentes á sua aplicação, apenas deve intervir quando outros ramos do Direito se mostrarem ineficazes para a proteção de determinados bens jurídicos. Mas, será que tais metas estão sendo levadas em consideração pelo legislador pátrio ? Ao que tudo indica, a resposta à esta pergunta só pode ser negativa.
Para que o Direito Penal atinja as metas supramencionadas, deve ser, segundo o Profº. Alberto Silva Franco, racional, previsível e transparente. E para tanto, segundo o eminente penalista, deve ser formal. Segundo ele, a desformalização não se traduz no melhor meio de solucionar os conflitos porque põe em risco as garantias do cidadão. Sendo assim, é de se questionar: os preceitos desformalizadores contidos na Lei 9099/95, por exemplo, são benéficos ou prejudiciais? Pelo que temos visto na prática, a Lei 9099/95 tem sido responsável por injustificados atentados à liberdade do cidadão.
Pare e pense: a tão falada transação penal, por exemplo, por vezes “atropela” o princípio da culpabilidade, que é uma das mais importantes conquistas do Direito Penal. Vejamos um exemplo prático: um motorista que trafegava com velocidade compatível com os padrões da via, atropela uma senhora que saiu correndo de dentro de uma casa. Em face do ocorrido, o motorista para, socorre a vítima, e a leva ao pronto socorro mais próximo e, após ter constatado que esta sofreu algumas escoriações de ínfima gravidade, vai embora. Após algum tempo, ele é surpreendido com uma intimação para comparecer em juízo, para uma audiência de composição de danos, na qual é proposta (e aceita pelo acusado) transação penal, nos moldes do que preceitua o artigo 76 da Lei 9099/9, a qual acaba por impor o pagamento de uma cesta básica à uma instituição de caridade.
É de se questionar: que “culpa” o acusado teve para ser obrigado a arcar com o pagamento de uma cesta básica ? O acusado não agiu com culpa, mas, para se livrar do “peso” de ser processado criminalmente, prefere aceitar a proposta oferecida pelo represente do Ministério Público. Cremos ter ficado evidente, no exemplo citado, a afronta ao princípio da culpabilidade.
A propósito: Para que fique evidente a coerência destas afirmações, cremos ser oportuno que se atente para as elucidativas lições dos Mestres Eugênio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli que assim podem ser transcritas: vulnera-se através da transação penal o princípio da culpabilidade, na medida em que se abstrai o fato de o agente ser verdadeiramente responsável pela prática da infraçãoEnfim: as garantias individuais do cidadão são colocadas em risco quando se busca a solução de determinados conflitos de maneira transacional, desformalizada.
Sendo que: sobre este particular aspecto, cumpre que se atente para a indagação feita pelo Profº. Alberto Silva Franco, que assim pode ser transcrita: não seria mais adequado descriminalizar os fatos de pequeno potencial ofensivo do que equacionar soluções de conflito fora do processo formal ?
Outro aspecto digno de nota é a maneira como se tem feito a descrição de condutas criminosas. Segundo o supracitado penalista, não são poucos os tipos compostos de termos vagos que, ao invés de garantir o direito de liberdade do cidadão frente ao poder repressivo do Estado, tornam-se instrumentos políticos da própria ação estatal.
Vejamos um exemplo: diz o artigo 131 que “praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio” sujeita o agente à uma pena de reclusão de 01 (um) a 04 (quatro) anos. Mas o que vem a ser, efetivamente, uma moléstia grave ? Cremos que esta lei penal em branco ultrapassa os limites toleráveis.
Como estamos falando de incoerências na seara penal , não poderíamos deixar de lado a famosa Lei dos Crimes Hediondos. Antes de mais nada, cumpre ter em mente que sua promulgação foi determinada pela pressão exercida pelos meios de comunicação. Quando da promulgação da Lei dos Crimes Hediondos, um sentimento de pânico e de insegurança – muito mais produto da comunicação do que de realidade – tinha tomado conta do meio social e acarretava como conseqüências imediatas a dramatização da violência e sua politização, sendo que, tal como leciona o Profº. Alberto Silva Franco, a Lei 8072/90 foi a resposta articulada por grupos políticos autoritários. Segundo o penalista em questão, o referido diploma legal se constitui em sendo verdadeiro edital de convocação para a luta contra uma determinada tipologia delitiva.
Como estamos falando de incoerências na seara penal , não poderíamos deixar de lado a famosa Lei dos Crimes Hediondos. Antes de mais nada, cumpre ter em mente que sua promulgação foi determinada pela pressão exercida pelos meios de comunicação. Quando da promulgação da Lei dos Crimes Hediondos, um sentimento de pânico e de insegurança – muito mais produto da comunicação do que de realidade – tinha tomado conta do meio social e acarretava como conseqüências imediatas a dramatização da violência e sua politização, sendo que, tal como leciona o Profº. Alberto Silva Franco, a Lei 8072/90 foi a resposta articulada por grupos políticos autoritários. Segundo o penalista em questão, o referido diploma legal se constitui em sendo verdadeiro edital de convocação para a luta contra uma determinada tipologia delitiva.
Um dos aspectos mais criticados da Lei 8072/90 é a ausência de definição de crime hediondo. O diploma legal não define esta categoria de crime, e sim etiqueta como tal alguns crimes já constantes em nosso ordenamento. Tal como enfatiza o supracitado penalista, não é hediondo o delito que se mostre repugnante, asqueroso, sórdido, depravado...mas sim aquele crime que, por um verdadeiro processo de colagem foi etiquetado como tal pelo legislador.
Também foi alvo de severas ( e coerentes) críticas o aumento desproporcional das penas e a eliminação de garantias penais e processuais penais, além do que, segundo a doutrina, era evidente, desde o início, que o diploma legal em comento não atenderia seus objetivos, mas sua promulgação tinha utilidade (discutível) na medida em que acalmaria os ânimos de uma coletividade amedrontada, lhe daria a impressão de que o legislador estava preocupado com a criminalidade violenta. O que se viu, no entanto, após a promulgação deste diploma legal, foi o um crescente aumento de ocorrência dos chamados crimes hediondos.Por fim, cabe ressaltar que a meta da intervenção mínima também está longe de ser alcançada. Não há, segundo o Profº. Alberto Silva Franco, uma correspondência entre o discurso da intervenção mínima e a realidade legislativa. Segundo o penalista em questão, ao invés da renúncia formal ao controle penal para a solução de alguns conflitos sociais ou da adoção de um processo mitigador de penas, com a criação de alternativas à pena privativa de liberdade, ou de uma busca, no campo processual, de expedientes idôneos a sustar o processo de forma a equacionar o conflito de maneira não punitiva, parte-se para um destemperado processo de criminalização penal no qual a primeira e única resposta estatal, em face do surgimento de um conflito social, é o emprego da via penal.Por isso: após estes sucintos comentários, há de se concluir que o
Direito Penal está longe de atingir seus fins, está longe de chegar onde deve.
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